1 + 1 = ∞

Fluente

Eu amaria viver
como um rio flui,
carregado pela surpresa
de seu próprio desdobrar.

(John O'Donohue)

 
Paul Gauguin’s Tahitian Landscape (1891) famous painting. Original from the Minneapolis Institute of Art. Digitally enhanced by rawpixel.

Caminante, son tus huellas el camino, y nada más; caminante, no hay camino, se hace camino al andar. Al andar se hace camino, y al volver la vista atrás se ve la senda que nunca se ha de volver a pisar. Caminante, no hay camino, sino estelas en la mar.

― Antonio Machado, Campos de Castilla


Gravação


Poemas

Liberdade de expressão

Meus pés aguardam ali, escutando, e quando
eles não gostam do que acontece eles começam
a pressionar o chão. Eles sabem quando
é hora de sair de um evento. Logo
eles estão se movendo, e conforme o evento esvanece
dá para ouvir o som dos meus pés no cascalho.

Se você tem pés com critérios, você também
talvez se recorde – você não precisa
aceitar o que é dado. Vocês, jogadores,
cafetões, fanfarrões, gente opressiva: –
”Não aqui,“ meus pés dizem, “não, obrigada";
”me deixe ir embora". E lá me vou.

(William Stafford)

Um canto à primavera

O dia é levado por cada coisa e cresce à compleição. 
Eu saio e volto e saio de novo,
confusa com uma beleza que não conhece interrupção,
que espraia como fogo. Todas as coisas se movem mais rápidas
do que o tempo e criam, com isso, uma quietude. Minha mente
se reclina e sorri, sem nada a dizer.
Até mesmo à noite eu saio com uma luz e observo
o crescimento. Me ajoelho e olho para uma coisa
de cada vez. Uma aranha branca num botão de peônia.
Não tenho nada a entregar, não sou boa serva,
mas posso cantar a primavera. Cantar essa selvageria que não
se preocupa com a hora. A corça que não
para na escuridão mas continua a crescer a noite toda.
A beleza em todo grau de florescimento. Violetas
se erguem para a chuva e o córrego canta mais alto do que nunca.
O velho fazendeiro está dormindo e as flores seguem se
abrindo. Há estrelas. A menta cresce alta. Folhas
se dobram na luz do sol enquanto a chuva segue caindo.
(Linda Gregg)

Propostas de férias

Aqui encontram algumas sugestões de práticas para esse momento de férias. Pode ser um momento oportuno de aprofundar bastante a relação com manjericão e petitgrain, mas também para rever qualquer outra dupla com a qual trabalhamos no percurso.

Atravessia

Nosso período de férias agora coincide com a chegada do verão (inverno) e com a virada do ano, esses dois fenômenos agregam à nossa experiência elementos interessantes de pesquisa: entre o ciclo que fecha e aquele que abre, um espaço intermediário, um espaço de travessia e de atravessamento, onde as fronteiras e bordas se diluem, onde passado e futuro se encontram.

Mas pensemos nisso a partir da perspectiva da selvagem alegria que viemos cultivando e experimentando, a partir do imenso potencial criativo que cada uma carrega, nutrido tanto pelo desejo e querer, quanto pela nossa história, o chão e o corpo que, a cada dia, a gente cria. Como habitar a água salobra das transições? Como deixar que, nela, a nossa liberdade de criar possa se deixar manifestar?

Manjericão e petitgrain podem ser fortuitos companheiros para dar o tom da pesquisa: diminuindo medos, adensando isso que é o nosso cerne, aquele espaço que emana potência, que expande justamente porque denso e centrado, ciente de si. Ao mesmo tempo, posta a densidade, onde podemos assentar, enraizar, quando a fuga não é mais uma necessidade? O que surge como possibilidade e caminho de criação aqui? Entre o chão de ontem e o passo que queremos dar amanhã? Entre a potência criativa e a tranquilidade nutridora…?

Temos um período todo para ir, lento, investigando, tateando e dando forma a todas essas sensações, desejos, ideias… A passagem não se dita pelo número do calendário, mas nesse trânsito que construímos orientado para aquilo que muda e o que se quer mudar (e esse espaço entre as correntes subterrâneas e aquelas que efetivamente construímos, essa relação, é também outro berço de incrível potencial).

O convite, assim, é para a aberta possibilidade de sustentar os votos, de ensaiar, modificar, escutar e tecer, como quem busca a forma, no resguardado espaço dos entres, protegida pela singular potência da sobreposição de inícios e fins.


Práticas de reconexão

Nesse período de tantas emoções e informações – de festas, encontros, desejos, pedidos…–, de um pulsar mais e mais orientado para o mundo externo, o silêncio pode surgir como demanda, como chamada ao reequilíbrio. Então aqui ficam alguns convites simples, que podem ser tão lúdico e tão longo quanto quiserem.

O caderno ocupado

Durante esse período de festas e férias, na ausência dos nossos encontros, ter o caderno por perto, sabê-lo um espaço disponível e pronto para receber, para acolher, para dar vazão a qualquer coisa que se apresente. Quero dizer, reconhecer o caderno como recurso de navegação e travessia. Seja como um lugar para fazer um somagrama, anotar/desenhar um sonho, anotar/desenhar algum insight. Seja como lugar onde revisitar os próprios processos, reler e lembrar onde esteve, o que está mobilizando e construindo, quem se é e quem se tem sonhado ser.Os espaços de trânsito podem trazer certo desenraizamento, e o caderno é o lugar a partir do qual podemos lembrar e nos reconectar. Saber que está ali, se cuidando, que os processos estão sendo olhados e acompanhados, reconhecer no caderno a companhia e o cuidado que se dá, tudo isso alimenta a nossa relação interna, devolve ao movimento diário esse sentido de segurança e de conexão.

O corpo vivo

Esse convite é um lembrete: a página de práticas corporais está aberta, assim como as gravações dos nossos encontros. Sempre, diante de qualquer sensação de desencontro interno, podem retornar ao corpo como quem busca novamente o solo do lar. As práticas podem ser usadas como espaços de reencontro e de descanso, como espaços de reabastecimento interno.Na página de práticas, há algumas que são mais versáteis, como aquela de retomada de fluxo ou a de vitalidade. Estas nos ajudam a modular as intensidades, para quando falta ou quando excede. Há também as mais específicas, algumas que abrem e conectam pernas e presença, outras que abrem espaço no peito, no diafragma… a escolha entre essas pode sempre ser feita a partir da escuta interna: como fazemos nas práticas de chegada, sentar por um momento e se conectar com aquilo que está. A partir daquilo que observa, perceber então o que o momento e o corpo pedem. Só isso, esse gesto de escuta, já pode ser profundamente regenerador… diante disso, ainda poder se entregar aquilo que encontra como necessidade pode ser lindíssimo nesse caminho de atenção à relação consigo e com seu corpo.


A selvagem alegria:
pele, poro, prazer – um exercício

Comecemos assim, passo 1: uma lista daquilo que te dá prazer, que te causa alegria. Anote em algumas linhas aquilo que te alegra e que te dá prazer.

Passo 2: releia a lista e perceba o eco dela no corpo. O que nota?

Passo 3: de modo demorado, uma pesquisa:

Estamos falando cada vez mais de prazeres e, em preparo para os próximos encontros, este convite: uma página do caderno com o título – “coisas que são cheias de prazer”. Aqui, não falamos só da nomeação daquilo que nos alegra, mas a nomeação de como o prazer se instaura no corpo, como ele se sinaliza e constrói e quais as suas especificidades.

É enganosamente simples relembrar o prazer, o prazer real, aquele sentido e não só o pensado. E em temporadas de inventários e planos, saber diferenciar o que é sentido como prazer e alegria daquilo que só achamos que nos alegra – aquilo que achamos que deve nos alegrar, aquilo que nos ensinaram a ser o alegre e prazeroso, aquilo que é a construção social da alegria – pode ser de imensa valia e contribuição para que nossos passos sejam dados mais e mais em concordância com o nosso pulso interno.

Exemplifico:

em determinado momento da minha vida, percebi uma comunicação sutil do meu corpo, o arrepio. Acompanhando isso, fui adentrando mais e mais nos elementos que o excitavam e nos causavam imensa alegria: a primeira água do banho nas costas, a mão no peito inaugurando o momento de escuta, o cheiro intenso das gardênias na rua, o barulho do trovão que faz irromper a tempestade. Eram coisas simples, quase nada havia aparecido na minha lista inicial.

A partir dessa pesquisa diluída nos dias (e pode ser uma pesquisa contínua, a pesquisa de uma vida), montar uma nova lista.

Passo 4: refletir e comparar.