Encontro 2: pinho siberiano

Aqui começamos.
Acompanhadas de Pinho, cruzamos o portal do mundo externo e iniciamos o caminho pelo mundo interno. A descida, o silêncio selvagem… Nesse processo de desnudamento e entrega para a transformação, abrimos espaço para a revelação de uma espécie de deus/deusa fugidio, o caminho para a fonte, para o Self. 

Apesar de difícil, o caminho guarda suas delícias. Desnudar-se – a redescoberta de formas esquecidas, não exploradas.
Respiração, pele e ossos – o pulso do corpo e o que ele revela.
No toque das mãos, nos escuros e silêncios – o pouso suave, como quem descansa à sombra, perto da fonte.

A Esfinge

Não há perguntas. Selvagem
o silêncio cresce, difícil.

Gravação

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Um percurso poemático

Inventário

Inventário dum caminho – que estas mãos compreendem, que os olhos sublinham, legível aos pés.

Supérfluo o vestuário, o homem respira – um tronco e a terra aberta em palma.

Maciço e transparente, tudo o penetra e tudo se absorve e se transmite na ligeireza vasta.

A resposta seria um sorriso – a simpatia de uma respiração fraterna.

O rosto na amplitude – reconquista a sua dimensão generosa.

Não há música, mas o que se vê é excessivo e ondula na imobilidade.

Um galo canta do fundo do horizonte, à flor da terra, em nós mesmos.

~ António Ramos Rosa

— António Ramos Rosa

O vento

O ar que se levanta com olhos móveis
quer às vezes ser árvore ou um sol muito escuro.
Vem do fundo onde tudo se cala sobre uma pedra branca.
Busca o odor das ilhas, busca a garganta perfeita
ou uma coluna de pombas. Às vezes nada está vivo
e o vento levanta-se com as suas artérias ligeiras.
E o mar ascende mudo até à boca do vento.
Nos meandros claros aviva-se a visão de uma paisagem
em movimento como um grande pássaro transparente.
Porosa e frágil é a mão que sublinha a caligrafia do vento.

António Ramos Rosa

A presença

Entre o saber e o poder
a mais ligeira ponte.
Entre as ruínas dos olhos e a limpidez da luz
as frágeis escadas de sombra.
Entre a língua cega e as palavras intactas
a mão que procura o hálito de um deus
na revelação do mar e do poema.
O que se resolve em espuma no final de uma frase,
o que vem do fundo ininteligível da noite
e é uma súbita ordenação transparente
e o frémito de um equilíbrio, uma modulação, uma frescura
e o reino absoluto no instante, o verdadeiro
e um grito, um grito de alegria na sua forma pura.

Simplicidade da presença discreta, furtiva e no entanto límpida,
coerência fragílima, claridade confiante à beira de ser nada.
Era o que esperava, era o que não esperava no imediato sabor das palavras e das coisas.

António Ramos Rosa